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2017 foi um ano extraordinário em leituras. No meio dos quase 80 livros, alguns destacaram-se pela sua qualidade, pelo tema abordado, pela escrita e pelo impacto. As Lamas do Mississípi foi, seguramente, um desses livros.
Quando, a semana passada, percebi que ia estrear em Portugal o filme baseado nesse mesmo livro fiquei com mixed feelings. Dum lado a excitação por um livro extraordinário ser adaptado ao cinema e, portanto, a sua história (e que história!) ter hipótese de chegar a mais pessoas, por outro o medo que - como habitual - estragassem o livro, alterando personagens ou acontecimentos.
Ontem foi a ante-estreia e, em resultado dum passatempo organizado pela Saída de Emergência, tive oportunidade de o ir ver.
134 minutos. Esta é a duração do filme e posso afirmar, sem qualquer margem para dúvida, que passaram num ápice. Quase que nem dei conta do tempo passar. Entre interpretações fantásticas e um respeito quase absoluto pela história original, o filme é, claramente, um dos melhores que vi nos últimos tempos e talvez entre, assim de repente, para os livros que podemos julgar pelo filme.
A única coisa que realmente me aborrece nisto é que a editora mudou a capa do livro. A capa original era soberba e agora a capa que vi é com a imagem do filme. Não façam isso! os livros merecem capas próprias, como esta:
E não capas como esta:
(apesar dos actores serem muito jeitosos, mas adiante)
Portanto... importam-se de me fazer o favor de ir ver este filme e de ler este livro?
Entretanto...
Lá em casa ninguém gosta de ver um filme ou uma série comigo se desconfiarem que já li o livro. Não consigo perceber porquê... talvez tenha a ver com o facto de passar o filme a arengar porque, na grande maioria dos casos, a história é completamente alterada e não é respeitado o livro.
Já se sabe, um livro é sempre mais completo. Mais perfeito. Mais livro. E é quase impossível passar para um filme toda essa perfeição. Mas às vezes consegue-se (era mesmo bom que a indústria cinematográfica aprendesse com estes exemplos):
O Quarto de Jack – as diferenças entre o livro e o filme são inevitáveis. O livro é narrado por uma criança de cinco anos e a angústia que sentimos resulta - em boa parte - dos pensamentos de Jack, da forma como ele vê o mundo. A menos que o filme fosse narrado (o que era capaz de se tornar uma grande seca), esses pensamentos não se conseguem traduzir em imagens. Ainda assim foi feito um excelente trabalho.
Milagre no Rio Hudson – um caso raro em que o livro e o filme se complementam na perfeição. O livro conta-nos a história de Sully, a pessoa certo no local certo, mostrando-nos como tudo o que se passou na vida de Sully foi essencial para que, naqueles três minutos e vinte e oito segundos, ele soubesse exactamente o que fazer para salvar as 155 pessoas que iam a bordo daquele avião. Já o filme foca o trabalho da comissão de inquérito e a tentativa que fizeram para provar que Sully tinha errado (como é possível terem pensado, nem que fosse por apenas uns segundos, que tinha havido ali erro se se salvaram todos os passageiros e tripulação?). Ambos - livro e filme - são importantes.
Viver depois de ti – um excelente livro que trata um tema polémico. A eutanásia. Um excelente filme, completamente fiel ao livro. São poucos os casos em que se pode dizer que o filme é o livro, mas este Viver depois de ti é, talvez, o mais fiel dos fieis, talvez em Ex aequo com os dois que se seguem.
Um Homem Chamado Ove – um dos livros mais ternurentos que já li, um livro que nos deixa - com humor q.b. - a pensar no dia-a-dia, nas coisas realmente importantes, em como mudamos - às vezes sem querer - a vida de quem nos rodeia e na importância que - mais uma vez, às vezes sem querer - temos na vida dos outros. E que os outros tem na nossa vida. E um filme exactamente igual, em que até os actores são, em quase tudo, tal e qual como os imaginamos enquanto líamos o livro. Óscar da melhor adaptação para aqui, por favor.
A Rapariga que Roubava Livros – outra fabulosa adaptação, em que nada falha em relação ao livro. A ternura que nos inspira o livro é rigorosamente a mesma que nos inspira o filme. Mesmo que tenha a morte como narrador.
E vocês, que outros casos conhecem em que a adaptação do livro ao cinema tenha corrido tão bem que eu posso ver o filme com a família?
Fui ao cinema. Aos anos que não ia a uma sala de cinema mas quando vi que este filme estava nas salas (vá, em duas salas!) não resisti e lá fui.
E antes que perguntem porque é que estou a falar dum filme num blog dedicado a livros, deixem-me dizer-vos que Um Homem Chamado Ove é um livro excepcional, que li em 2016, por recomendação duma boa amiga dos livros, a Sara. Um Homem Chamado Ove é dos livros mais ternurentos que já li, um livro que nos deixa - com humor q.b. - a pensar no dia a dia, nas coisas realmente importantes, em como mudamos - às vezes sem querer - a vida de quem nos rodeia e na importância que - mais uma vez, às vezes sem querer - que temos na vida dos outros. E que os outros tem na nossa vida.
Foi por isso que fui ver este filme. A medo, confesso, já que, no binómio Livros vs Filmes, os filmes saem sempre a perder, com as pessoas irritadas comigo (as que se atrevem a ver os filmes comigo!) porque passo o filme a resmungar que está mal feito, que a história não é assim, que as personagens isto ou aquilo (aliás, normalmente nota-se imenso as diferenças nas personagens). Acreditem, se eu tiver lido o livro primeiro, não é fácil ver um filme comigo. Eu própria não gosto de o ver comigo...
Ia, dizia eu, com medo para o cinema. E até comentei com quem foi comigo - a Joana - qualquer coisa como: vamos lá a ver se não me estragaram o Ove.
Não estragaram e isso deixou-me tão feliz.
As personagens estão bem caracterizadas e respeitam a ideia com que ficamos após a leitura do livro. A evolução de Ove e a sua interacção com os outros está fantástica. E até a frase que adorei no livro é dita, exactamente com a mesma expressão que imaginei enquanto lia:
Ove não tem jeitinho ABSOLUTAMENTE NENHUM para morrer!
Faltam, naturalmente, algumas cenas hilariantes, nomeadamente a compra do ipad, mas até eu percebo que é impossível, num filme, mostrar tudo ao pormenor como num livro.
Ainda assim, uma adaptação fabulosa, vencedora, para mim, do Óscar de melhor adaptação de sempre, ali bem pertinho da adaptação para filme do livro A Rapariga que Roubava Livros.
Fiquei com vontade de reler o livro. Infelizmente para mim (e felizmente para quem pertence à iniciativa), Um Homem Chamado Ove está a circular no âmbito do segundo round do livro secreto.
Mas quando regressar, é certinho. Vou reler. Quanto a vós, se ainda não viram o filme ou leram o livro... façam a vocês próprios um grande favor. Leiam o livro e vejam o filme. Não se vão arrepender.
Quantas vezes lemos um livro, criamos a imagem duma personagem e, depois, quando vemos o filme sobre esse livro achamos que está tudo errado e que aquele actor foi muito mal escolhido porque a cara não corresponde ao que esperávamos?
De tantas vezes se sentir enganado, Brian Joseph Davis decidiu mostrar, usando tecnologia policial, as caras que os livros descrevem para que possamos avaliar se os actores foram bem escolhidos. E, se nuns casos a coisa correu bem, noutros nem por isso.
Ora vejamos 15 exemplos (depois podem ir ver mais aqui)
Jack Torrence, “The Shining”- Stephen King
Annie Wilkes, “Misery”- Stephen King
Daisy, “The Great Gatsby”- F. Scott Fitzgerald
Dracula, “Dracula”- Bram Stoker
James Cromwell, “LA Confidential”- James Ellroy
Christian Grey, “Fifty Shades of Grey”- E.L. James
Katniss Everdeen, “The Hunger Games”- Suzanne Collins
Lisbeth Salander, “Girl With the Dragon Tattoo”- Stieg Larsson
Humbert Humbert, “Lolita”- Vladimir Nabokov
Marla Singer, “Fight Club”- Chuck Palahniuk
The Monster, “Frankenstein”- Mary Shelley
Norman Bates, “Psycho”- Robert Bloch
Nurse Ratched, “One Flew Over the Cuckoo’s Nest”- Ken Kesey
Sam Spade, “The Maltese Falcon”- Dashiell Hammett
Tom Ripley, “The Talented Mr. Ripley”- Patricia Highsmith
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